novembro 11, 2008

when i feel heavy metal

Eu desci do meu carro depois de mais ou menos meia hora de busca por uma vaga. Eis mais uma daquelas pequenas coisinhas que a gente ganha de presente depois que a tal da responsabilidade vem bater nossa porta. Tudo um inferno, eu sinto falta de ter 15 anos.
De qualquer forma, estacionei o carro de Louise longe do restaurante porque era sexta, já passava das nove e aquele bairro está sempre movimentado.
Era engraçado porque Louise não estava com o carro dela mas estava no restaurante usando o meu carro. De qualquer forma, eu desci do carro e caminhei duas quadras até Louise que já deveria ter comido o suficiente para pagar um mês da minha faculdade. Aquele lugar era um assalto, era para turistas.
Eu olhei para ela ao longe, como estava gorda. E parecia um suíno de verdade quando comia, até achei que a ouvi roncar. Me aproximei:
-Desculpe a demora, o tráfico estava abusivo.
-Comi na sua frente, não agüentava mais de tanta fome. - Tinha molho na sua blusa.
-Não faz mal, não estou com fome. - E me servi do vinho na mesa que já estava com a garrafa pela metade.
Ela olhou com desdém para a minha taça, talvez não estivesse afim de dividir, mas que se dane, eu que iria pagar mesmo... "seu pai é rico, você não tem que se preocupar com dinheiro" dizia ela, só porque o meu pai tem um canavial no Brasil. O dinheiro que gasto é meu e é ralado, papai só ajuda de vez em quando. Em seguida ela acendeu um cigarro barato mas não parou de me fuzilar.
-Louise, o que tá fazendo? Não pode fumar aqui!
Ela continuou, revirando os olhos.
-Louise! As pessoas tão olhando para cá! Vão chamar o garçom! Louise, não quero ser expulso de um lugar como esse.
-Que se dane, eu preciso relaxar! Já sei porque você me chamou pra conversar.
Tossi discretamente depois de engolir alguns caracóis.
-Sabe? Como pode saber?
-Não finja, rapaz, eu sei que você quer terminar comigo, eu conheço seu olhar! E se não quisesse, teria vindo de metrô em vez de trazer meu carro para mim.
-Então é isso - falei áspero largando as chaves dela em cima da mesa, mas elas escorregaram para o chão porque tinham um chaveiro absurdamente colorido e pesado e gigantesco - por favor pegue suas coisas e saia do meu apartamento.
-Você não vai nem se justificar?
-Como assim me justificar? Tenho que sustentar nós dois, você come feito porca, vai repetir o período! Está ficando feia e rabugenta, nem sei a ultima vez que se lavou. Não dá mais.
-Isso foi bem esclarecedor.
-Então está satisfeita?
-Oui, oui. Mas... Tem uma coisa...
-Não tente, Louise, não me faça ser grosso, não quero chantagens emocionais em público!
-Não é isso, seu porco. Estou grávida.
-Qual, o que?! Falei que não cairia em chantagens emocionais.
-Estou falando sério, insensível! - E retirou da bolsa uma pasta com um exame médico. Passei os olhos rapidamente, confirmei, a vadia tinha realmente conseguido ficar gravida naquela hora.
-E você ainda fuma nessa situação? - falei baixinho, estava abalado.
-Pro inferno, não vou ter essa criaturinha com você.
-E eu não posso escolher?
-Escolher o que? Escolher ter dividas de pensão todo mês? Se quiser um, vá ter com alguém que ama.
-E você não me ama?
-Amo.. Amava.. Não sei, agora queria que você morresse.
-Isso é amor.
-Está bem, - falou baixinho também enquanto apagava o cigarro envergonhada - eu quero muito essa criança, mas não se você não me quiser.
-Nosso filho não tem nada a ver com isso.
-Claro, é por isso que vou cobrar o dobro para a pensão, ele precisa crescer saudável você sabe, não sei quando vou conseguir arranjar emprego.
-Sua gananciosa.
-Meu caro, foi você que escolheu estarmos aqui agora nessa situação.
-Aqui eu não escolhi não, você que escolheu o lugar. Esse lugar é caro demais, fere meu bolso.
-Seu pai é rico, você não tem que se preocupar com dinheiro.
E foi assim que perdi a cabeça. Levantei rápido e cheio de ira, chinguei Louise de todos os nomes feios que sabia em francês e português em alto e bom som para que todo o restaurante ouvisse. Depois atirei a mesa contra a pobre coitada e dei as costas, fugindo de mãos e braços de garçons e burgueses.
O engraçado é que, enquanto Louise chorava para mim e todos bravejavam em minha direção, tudo que ouvia era uma absurda distorção da sinfonia de Bach que tocava ao fundo. Aquilo tinha virado heavy metal.

Um comentário:

Bruna monteiro disse...

eu pensei que ia ser o final:

" okay sua vadianzinha vamos ter essa criatura!" e foi assim que eu e Louise ficamos juntos para sempre.